Encontro Latino-Americano de Comunicação e Sustentabilidade

"A energia é o sangue do sistema"

Por Isabel Gnaccarini, para a Envolverde

Com a frase acima Ladislau Dowbor, professor titular da PUC-SP nas áreas de economia e administração, resumiu o debate em torno da energia para o desenvolvimento ocorrido no último dia de evento (19), do Encontro Latino-Americano de Comunicação e Sustentabilidade. Na mesa-redonda Dowbor, Karen Suassuna (WWF) e Paulo Fernando Rezende (Eletrobras) trataram da evolução da matriz energética brasileira até 2020. O Brasil, “cujo padrão é iminentemente sustentável, possui uma situação particular em possuir um gigantesco capital de solo e água que o coloca em regime de autonomia e independência em termos de energias de fontes renováveis e limpas”, lembrou o professor e economista.

Com o dado em mente, alertaram para as infinitas possibilidades em associarmos soluções alternativas às mais tradicionais, balanceando tudo com políticas inteligentes de redução e economia de uso dos recursos. Para Dowbor, trata-se de campanhas em prol da economia doméstica e empresarial, em cuja adesão ele acredita. Mas também de soluções alternativas já comprovadas de experiências que acabam gerando economias mensais para populações no bolso de quem ela faz muita diferença. Segundo Karen, do WWF, moradores economizam cerca de R$ 40 reais mensais em projeto de um bairro popular em Belo Horizonte, onde placas solares complementam o fornecimento de eletricidade da concessionária oficial. Este exemplo em escala é interessante para as geradoras de energia no Brasil como auxiliares de ‘ruptura’, ou seja, dos picos de consumo em determinadas horas do dia, evitando colapsos no sistema e até diminuindo investimentos de grande porte - as alternativas podem auxiliar no redimensionamento de redes de fornecimento, cujas
metas são calculadas sobre as demandas do país.

O Brasil tem na geração hidrelétrica seu principal recurso energético, e caminha para os mesmos padrões em termos de biocombustíveis. No entanto, “o problema da energia é sistêmico, e de consumo: quanta energia está nos lixos que produzimos?”, diz Dowbor. Esta visão mais integrada para o Brasil é necessária para chegarmos a novos parâmetros de Desenvolvimento Sustentável. A produção de energia através de recursos fósseis, a emissão de gases por conta da queima de carvão vegetal (que deixa, atrás de si, desmatamento), e a própria expansão extensiva da agricultura para a produção de biocombustíveis pressionam as mudanças climáticas no planeta. Enquanto isso, “as vias alternativas inseridas na matriz energética do país geram benefícios não apenas ambientais, mas econômicos e principalmente sociais”, complementa.

Nos estudos do WWF, o cenário sustentável possibilita gerar 8 milhões de postos de trabalho, o que corresponde a 3,5 milhões de empregos a mais do que na situação convencional. O impulso a alternativas, inclusive a eólica, diminui impactos ambientais advindos da expansão de grandes hidrelétricas; estabiliza as emissões de CO2 na faixa de 20 milhões de toneladas; e traz economia de R$ 33 bilhões até 2020.

Energia e Informação

O engenheiro Paulo Fernando Rezende, encarregado da Divisão de Acompanhamento de Empreendimentos de Geração da Eletrobras e responsável pelos estudos em torno da usina de Belo Monte no Xingu, prevê que até 2017 essa hidrelétrica seja responsável por 5,5% do consumo nacional, tendo como característica a versatilidade em distribuição de energia para três grandes regiões brasileiras (Norte, NE e SE), otimizando seu fornecimento de acordo com as demandas sazonais. O engenheiro defende a informação aberta e a educação para as populações atingidas pela obra, mas também a necessidade de mitigações sociais e ambientais, bem como financeiras. No caso de Belo Monte, serão R$ 138 milhões para uma geração de 40 milhões de Mw/h; metade para os 7 municípios envolvidos, onde estão as 19.242 pessoas que sofrerão revezes com a instalação, e metade para o Estado. A proposta da Eletronorte é administrar (e preservar) as Unidades de Conservação e as Terras Indígenas vizinhas à obra. “Para nós é preferível que a água chegue até n
ós limpa e sem poluentes”, afirmou.

A informação é de fato uma ferramenta de base para o debate, segundo Ladislau Dowbor. Ele vê a importância da qualidade da informação como guia da transversalidade nos temas associados à questão da energia. “As decisões governamentais são compartimentadas, e se desprendem de poderes econômicos. Mas também vêm de instâncias políticas descoordenadas (seja um ministério e não vários, seja em termos da distância entre atores municipais, governamentais e federais)”, enfatiza.

Karen Suassuna concorda: “Por ser uma questão de governos, ONGs como WWF ou Greenpeace não substituem a ação governamental nos estudos e propostas que levem o Brasil pelo caminho da sustentabilidade. O Brasil efetivamente não possui dados sobre ciclos de vida dos produtos, da produção ou sobre eficiência energética”, alerta ela, para quem estes dados são fundamentais nas negociações internacionais. “O planejamento integrado e a análise sistêmica são fundamentais na hora de negociar”, diz.

No debate, reverberaram algumas perguntas úteis aos “informadores da sustentabilidade” quando face ao tema: “o que fazer para tornar a eficiência energética um bom negócio?”; “Se nossa matriz é a água, o desmatamento é um gargalo em 30 anos, visto que com este teremos menos água?”; “Investimentos feitos hoje em hidrelétricas já seriam um péssimo negócio em um setor cujo planejamento se faz para 50 anos?”; “Se metas para os biocombustíveis forem alcançadas, é possível que nossa frota de carros dobre - onde iremos colocar todos estes carros, ou toda essa gente que as usinas põem fora de suas terras?”

*A cobertura do Encontro Latino-Americano de Comunicação e Sustentabilidade está sendo feita por uma equipe de jornalistas. A coordenação é de Naná Prado e o material será publicado no site da Envolverde (http://www.envolverde.com.br) e do Mercado Ético (http://www.mercadoetico.com.br).


Crédito de imagem: Clóvis Fabiano


(Agência Envolverde)